Padre Penido nos propõe a meditação sobre a saga de um certo homem – que como ficará obvio representa a cada ser humano que caminha, já caminhou ou ainda caminhará sobre esta Terra –, que desde sempre se deixou arrastar por um estilo de vida vivida “no automático”, e assim a vive todos os dias; os problemas da sobrevivência individual, as questões familiares, as exigências profissionais, o alternar dos afazeres, obrigações e distrações… Enfim, aquela sucessão infinita de problemas pequenos dos quais se compõe a monotonia cotidiana: isto é o que acaba lhe tomando, no fim, todo o tempo de sua vida. Ele não pensa muito além do futuro imediato, sobretudo não pensa na morte. E acha que é melhor assim.
Mas eis que um acontecimento inesperado – um acidente, uma tragédia, uma doença e/ou a perda de um ente querido, por exemplo – arranca-o da rotina e faz despertar nele, enfim, a angústia metafísica, que o fará procurar ver o que há para além do horizonte do ordinário. Agora ele quer saber da transcendência. Por meio daquele choque, ele verifica que não é autossuficiente, que não consegue sozinho dar um sentido aceitável à própria vida; descobre então que, apesar do vertiginoso progredir das ciências, apesar de tanta tecnologia que temos agora, dos confortos e facilidades que estão ao nosso alcance como nunca antes, na realidade estamos mais longe do que nunca de responder às questões realmente importantes. Estamos cada vez mais distantes da solução dos nossos problemas mais fundamentais.
Este homem então sente o chamamento da morte, a vertigem desse instante no qual, cedo ou tarde – e, por mais tarde que seja, será sempre cedo demais –, tudo nos faltará, e seremos arrancados de todas as coisas às quais nos apegamos, mesmo que legitimamente, para mergulhar na imensa treva.
Dessa angústia metafísica surgem muitas interrogações inconvenientes. Valerá a pena viver? Qual é a razão de ser desses poucos anos de luta que nos são dados? Será a nossa existência nada mais que um amontoado de perguntas sem respostas? Ou, se há um sentido para tudo, qual é, afinal? O homem deveria perseguir que fim? Desfrutar de todos os prazeres possíveis, desde os mais grosseiros até os mais requintados? Ou, ao contrário, cultivar harmoniosamente o espírito, à custa de muito esforço e diligência, em busca do saber? Tentar dominar o mundo e o próximo para produzir e amontoar riquezas? Ou dominar sua própria natureza em busca de um evoluir espiritual? Ou será ainda que deveríamos lutar para estancar em nós a sede de viver e engolfar-nos na indiferença de uma espécie de “nirvana” – a libertação dos sofrimentos através da absoluta anulação dos movimentos da mente e dos sentidos?
No meio desse tumulto de pensamentos, levanta-se para o pobre homem uma voz serena e augusta; a voz da Igreja, portadora da eterna e infalível sabedoria: “Único é o sentido da vida: Deus. Única, por conseguinte, é a definição verídica e exata da vida: o caminhar do homem até Deus”. Porém, mesmo aquele que tem a Fé indagará, ao menos algumas vezes, durante esta jornada que é curta e que é longa: “Como atingir uma meta tão transcendente? Deus está longe demais, é inacessível demais… Alguém porventura já o viu?”.
Responderá então a mesma Igreja: “Sem a Fé é impossível agradar a Deus, pois para se achegar a Ele é necessário que se creia primeiro que Ele existe, e que recompensa os que o buscam” (cf. Hb 11, 6).
A Fé e somente a Fé pode dar sentido satisfatório à vida, porque só a Fé indica a meta real do nosso itinerário neste mundo, e também os meios de atingi-la. Vítimas – o mais das vezes inconscientes –, do indiferentismo dos nossos tempos, temos muitas, mesmo entre supostos católicos, pessoas para as quais a Fé não passa de alguma coisa como que facultativa. Padre Penido cita um antigo adágio que dizia: “Não ter fé e não gostar de música é privar-se de duas fontes de alegria”, e adverte contra esse engano bizarro; a verdadeira Fé cristã, longe de reduzir-se a uma espécie de agradável supérfluo, como é o caso da música e das artes no geral, deve ser a força que move toda a existência. Para nós, Deus é a verdadeira finalidade da vida, e a Fé o meio de alcançar Deus; logo, não ter Fé é o fracasso final.
“Quem crer e for batizado será salvo; quem não crer será condenado” (Mc 16, 16)”. Eis aí a razão da necessidade de se conhecer noções exatas sobre a natureza da Fé, que é o princípio da vida espiritual: eis a necessidade primordial da Teologia. Em todo esforço válido para definir a Fé cristã, importa, de início, discerni-la com cuidado e total honestidade, e separá-la de toda e qualquer ideologia humana, mesmo (principalmente) das que ostentem pretensões religiosas, algo que sempre aconteceu desde que existe a Igreja; hoje, é a realidade predominante.
Algo comum é que o seres humanos, especialmente os grandes pensadores, iludam-se e se empenhem numa tentativa inútil de escalar até o Céu por seus próprios esforços e capacidades, e terminem por formular sua religião “natural” e particular: vários filósofos deixaram-nos belas sentenças sobre a Divindade – e ainda que tenham nos brindado com poéticos aforismos e até alguns acertos, quantos erros graves já não foram ditos sobre Deus? Lembre-se que todo esforço solitário só poderá valer tanto quanto vale a capacidade individual de quem o empreende.
Consegue entender isto, dileto aluno? Nenhum de nós, por mais agraciado com uma alta inteligência e por mais que aprimore o seu intelecto nos melhores estudos, jamais poderá ir além de si mesmo.
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