Os Santos Padres
Os Santos Padres sempre distinguiram entre toda obra de estudo e edificação dos cristãos, dentre os diversos livros piedosos extrabíblicos – alguns dos quais chegaram a ser utilizados na Liturgia –, separando os de origem humana daqueles de origem divina. A estes últimos, atribuíam autoridade infalível com relação à Revelação e às verdades sagradas. Deus é o Autor de tais livros[1] e, ainda, os homens que os escreveram -(hagiógrafos), ainda que possam ser chamados “autores sagrados”, foram apenas instrumentos do Espírito Santo[2].
De fato, os Santos Padres e os autores eclesiásticos clássicos afirmam que os hagiógrafos foram a causa instrumental no que diz respeito à Inspiração, mas isso não significa que o hagiógrafo seja entendido como um objeto meramente mecânico, isto é, que agindo sob o influxo da Inspiração divina, perca o pleno uso das suas faculdades. Este é um falso conceito, proclamado pelos hereges montanistas e já refutado pelos Doutores da Igreja.
Não há, por outro lado, um sistema estruturado que a Igreja tenha formalmente apresentado como certo aos teólogos quanto aos modos da Inspiração. Ainda assim, podemos encontrar o germe da explicação teórica reconhecida junto dos Santos Padres, onde já se encontram certos elementos fundamentais. Como bons exemplos destas noções, poderíamos citar:
Orígenes (165-166/254-256) definiu com traços nítidos a obra do Espírito Santo e o papel do hagiógrafo:
O Espírito Santo habita nos hagiógrafos; investe-os, sobremaneira, impele-os a escrever e fala pela boca deles. Por sua vez, os hagiógrafos, ainda que instrumentos nas mãos do Espírito Santo, conservam o pleno uso das suas faculdades (humanas) tão manifesta e claramente iluminadas que os induz a escrever aquilo que compreenderam. A consciência de si mesmos neste ato (de escrever o que compreendem sob o auxílio do Céu) é o critério da verdadeira Inspiração.[3]
Santo Agostinho (354-430), falando de passagem sobre a questão da cooperação entre Deus, Autor principal, e o hagiógrafo, autor secundário, diz: “Deus usa do hagiógrafo como seu membro ou como seu instrumento, sem excluir, porém, a sua atividade pessoal”[4].
São Jerônimo adverte sempre, sobretudo nas observações preliminares dos Livros sacros, o trabalho individual e pessoal dos hagiógrafos na sua confecção.
__________
[1] Santo Agostinho (354-430), Contra Faustum, 15, 1; ML. 42, 301-303.
[2] São Justino (100-10 – 163-7), Apologia Prima (150-155), 36; MG. 6, 386 — Atenágoras, Legatio pro Christianis, 7, MG. 6, 904.
[3] Apud CHARBEL (2022), p. 32.
[4] Ibidem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Por favor, identifique-se com seu nome ou um apelido (nickname) ao deixar sua mensagem. Na caixa "Comentar como", logo abaixo da caixa de comentários, você pode usar a opção "Nome/URL".
** Seu comentário poderá ser publicado em forma de post, a critério dos autores do blog Fiel Católico.
*** Comentários que contenham ataques e/ou ofensas pessoais não serão publicados.