O motivo da Fé nos dá também a chave para entender a intransigência dos verdadeiros crentes sobre as questões de Fé; intransigência que sempre escandalizou os incrédulos e os indiferentes. Se é lícito transigir em matérias opinativas, mas ninguém transige, por exemplo, em relação às verdades matemáticas, com muito mais razão é impossível transigir sobre a Verdade divina. Acusar a Igreja de intransigência é confundir Fé religiosa com opinião religiosa. Uma opinião é, por natureza, sujeita à dúvida e à revisão; só deve mesmo ser aceita sob verificação. Ao contrário, no caso da Fé, sendo certíssima e fundada como está sobre a Palavra de Deus, transigir dela seria pôr em dúvida essa Palavra, logo conceder que Deus pode errar ou mentir.
Em matemática, vê-se o porquê da verdade, sem dúvida; aqui, não vemos, porém, sabemos que Deus a atesta, e isso tem que bastar. Entre a minha inteligência que não vê, e a Inteligência divina que vê, prefiro esta segunda.
O dever de lealdade para com a Revelação exige que a recebamos toda, inteira, sem escolhas e sem negociações: é a integridade da Fé. São Jerônimo já apelava para a etimologia a fim de lembrar que heresia significa exatamente “escolha” ou opção (um termo com origem no grego haíresis). O herege escolhe e peneira, do Testemunho integral de Cristo, algumas verdades, e repudia outras; escolhe segundo os devaneios de sua própria mente, dando preferência às suas impressões particulares do que às afirmações de Cristo.
Como é comum que, quando se discuta sobre Religião, reine, talvez inconscientemente, esse espírito herético da escolha particular. “Eu penso desta forma”… “Com isso eu concordo, mas daquilo eu discordo”… “Eu acho que…”…
É incontestável que sobre inúmeros pontos da Teologia e da moral, a Igreja deixa aberta aos seus filhos a plena liberdade de reflexão, discussão e decisão. E temos também, por abuso, a posição de muitos fanáticos que procuram impor a todo custo, como dogmas, as suas opiniões religiosas particulares. Já quando uma verdade nos é apresentada pelo Magistério supremo como revelada, não é lícito rejeitá-la ou mesmo pô-la em dúvida, sem fazer injúria à Palavra de Deus.
Essa aceitação incondicional supõe, é claro, um movimento de confiança total em Deus, pois é por nos fiarmos em sua Verdade e lhe aceitarmos o Testemunho que somos cristãos. Não há motivo, entretanto, para fazer como fez Lutero, isto é, confundir Fé e confiança; muito menos para reduzir, como o mesmo heresiarca, a Fé teologal à esperança de que a Bondade divina não nos imputará os nossos pecados. Crer em Deus implica certamente que temos confiança em sua Palavra, mas a Fé é antes de tudo a aceitação intelectual de uma verdade revelada. Assim, por exemplo, diz São Paulo que “pela Fé reconhecemos que o mundo foi formado pela Palavra de Deus e que as coisas visíveis se originaram do invisível” (Hb 11,3) e, uns poucos versos após, lemos o texto já citado: “para se achegar a Ele é necessário que se creia primeiro que Ele existe, e que recompensa os que o procuram” (Hb 11,6). Crer na existência de Deus, portanto, não é apenas um ato de confiança, é pura adesão do intelecto.
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