Mais um fruto da sola scriptura: pastor morre envenenado por picada de cobra


O pastor pentecostal Mack Wolford, 44 anos, da Virgínia Ocidental (EUA), que costumava usar serpentes durante os cultos, morreu neste domingo (27/8/12) após ser picado por uma cascavel, como informou o “The Washington Post”.

Wolford, como todo "pastor" pentecostal, interpretava literalmente a Bíblia, e era conhecido por usar a passagem em que Jesus diz que aos que crerem será dado o poder de pegar em serpentes e não sofrer nenhum mal: "Estes sinais seguirão aos que crerem: Em meu nome expulsarão os demônios; falarão novas línguas; pegarão nas serpentes; e, se beberem alguma coisa mortífera, não lhes fará dano algum; e porão as mãos sobre os enfermos, e os curarão" (Marcos 16,17-18).

"A Biblia orienta os cristãos a manusear serpentes para testar sua fé em Deus e que, se picados, serão curados pela fé", dizia o "pastor", que tinha na Bíblia sua única regra de fé e prática. - E, como notamos, não muita inteligência. O pai do "pastor", também membro da igreja, também costumava manusear os animais e morreu em situação semelhante, aos 39 anos.




Wolford organizou um culto em um parque no domingo, dia 27, e chamou membros de sua congregação e familiares, para que todos praticassem também o manuseio de cobras. Durante o evento, o pastor se sentou perto de uma de suas cascavéis e recebeu uma mordida na coxa.

O pastor foi levado para casa, mas, sempre movido pela interpretação literal da Bíblia, recusava ser medicado, enquanto os "irmãos" de sua igreja cantavam músicas gospel e pediam em oração pela sua cura. Só depois de piorar muito ele foi transferido para o hospital, onde foi declarado morto.

Até quando as seitas que se dizem "cristãs", mas desprezam a Igreja de Jesus Cristo, - pregando a Bíblia como única regra de fé e prática, e interpretando-a irresponsavelmente, - continuarão dando frutos como este?

** Leia também: Perigos da sola scriptura
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Fonte:
Jornalista Paulo Lopes
G1

Simbolismo e significados do Apocalipse: interpretação exegética do Livro da Revelação - parte 3

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Para uma melhor compreensão do texto bíblico, antes de ler cada carta, é importante conhecermos um pouco melhor cada cidade à qual foi destinada. Vejamos:

1) Éfeso, comunidade do "discípulo que Jesus amava"

Esta é a maior de todas as cidades das cartas do Apocalipse. Lá se encontra o mais importante porto da Ásia Menor. Como em todas as cidades do Império Romano, havia muitos templos dedicados aos deuses e deusas pagãos. O principal culto era dedicado a Ártemis, deusa da fecundidade. Também havia templos onde se cultuavam os imperadores romanos. Sua dedicação ao culto do imperador foi tanta que chegou a receber prêmios por isso.

Igreja: Nessa cidade surgiu, por volta do ano 50, uma comunidade cristã muito especial. Foi fundada por Paulo, que ali exerceu seu ministério por quase três anos. Esta é também a comunidade do Discípulo Amado, o berço do Evangelho de João.

Conteúdo desta carta

a) Títulos de Cristo: Aquele que tem em sua Mão Direita todas as comunidades da Igreja (Sete Estrelas). A Mão Direita é símbolo da Ação e Poder de Deus (cf. 2,1).

b) Mensagem: a comunidade é elogiada por sua resistência e incansável ação contra os ímpios, por ter colocado à prova e desmascarado os falsos "apóstolos" (que já existiam desde aquela época), e porque detesta os Nicolaitas. Porém, é reprovada por ter abandonado o “primeiro amor” (cf. 2, 2-4).

c) Promessa: o vencedor comerá da Arvore da Vida que está no Paraíso de Deus (cf. 2, 7).


2) Esmirna, comunidade exemplar

Enquanto centro portuário e comercial, era uma grande rival de Éfeso. Tinha uma lealdade especial para com o Império Romano. Chegou a construir um templo dedicado a deusa Roma. Também construiu um templo ao imperador Tibério. Ela era comparada a uma coroa. Aliás, o prêmio dado aos vencedores era uma coroa (2,8-11.2.1).

Igreja: a Igreja de Esmirna é formada por uma comunidade exemplar, à qual Jesus Cristo nada recrimina. É uma comunidade que sofre a tribulação e a pobreza.

Conteúdo desta carta

a) Título de Cristo: “O Primeiro e o Último, Aquele que esteve morto mas voltou à vida”(cf. 2,8).

b) Mensagem: A comunidade está numa condição de perseguição, de indigência, de hostilidade por parte daqueles que não a aceitam. Ela sofre tentações, porém se mantém fiel, “até a morte”. (cf 2,10).

c) Promessa: será preservada da “segunda morte”(cf 2,11) e receberá o dom da “Coroa da Vida”(cf 2,10).


3) Pérgamo, a tolerante

Esta cidade chegou a ser a capital da província romana na Ásia (aprox. 133 aC) e, por isso, se tornou o centro do culto imperial para toda a região. A cidade estava repleta de idolatria, e Zeus tinha lá o seu altar. Foi a primeira cidade da Ásia a construir um templo dedicado ao imperador Augusto (ano 29 d.C). Por tudo isso, João diz que nela está o “trono de Satanás”.

Havia em Pérgamo dois símbolos importantes: “A espada”, símbolo de autoridade, e a “pedrinha branca” que era entregue nos tribunais da cidade aos que eram absolvidos. Uma pedrinha branca servia também de convite para os banquetes oficiais. Nos jogos, o vencedor era premiado com uma pedra branca com o seu nome.

Igreja: a comunidade sofreu uma perseguição e já possuía um mártir, chamado Antipas. Por isso, Jesus elogia sua fidelidade. A comunidade, todavia, têm o pecado de tolerar os opositores do Reino de Deus (doutrina de Balão e dos Nicolaitas).

Conteúdo desta carta

a) Título de Cristo: Jesus é apresentado como “Aquele que tem a Espada Afiada, de dois cortes” (Cf. 2, 12), e que “luta contra os idólatras com a Espada que sai de sua Boca” (Cf. 2, 16).

b) Mensagem: Jesus chama a comunidade à conversão. Ela tem que dar testemunho contra a idolatria.

c) Promessa de recompensa: Ao vencedor é prometido o maná escondido e uma pedrinha branca, com um nome novo que ninguém conhece (Cf. 2, 17).


4) Tiatira: suas últimas obras são melhores que as primeiras

A cidade não tem importância política nem militar; é antes uma cidade de comerciantes e artesãos, organizados em corporações ou associações, que são os ancestrais dos atuais sindicatos de trabalhadores. Grande parte desses grupos ganhavam a vida lidando com fogo e metais. Como outras cidades, também em Tiatira havia cultos às suas divindades. Ali se destaca o culto a Apolo, que na Grécia antiga era tido como o deus da beleza masculina. Em Tiatira, era adorado como o deus-sol. Estudemos os textos de 2,18-29.

Igreja: A comunidade se destaca por suas obras, solidariedade, fé, serviço e resistência. Suas últimas obras são melhores do que as primeiras (ao contrário da comunidade de Éfeso). Mas também lá há pessoas, como Jezabel, que procuram corromper a comunidade.

Conteúdo da Carta

Esta é a mais longa das 7 cartas. Ao escrever à comunidade de Tiatira, João levou em conta a cultura popular e a vida dos trabalhadores dessa cidade.

a) Título de Cristo: “Aquele que tem os Olhos como chama de fogo e os Pés de bronze em brasa”. Jesus se apresenta como Divino “Metalúrgico” (cf. 2,18).

b) Mensagem: A comunidade realiza muitas obras (caridade, fé, serviço, perseverança) e está crescendo cada vez mais. A única reprovação é quanto à conduta de Jezabel e seus seguidores (cf. 2,20). Este nome é muito provavelmente também simbólico, recordando a esposa do rei Acab, a grande responsável pela idolatria em Israel no tempo de Elias (cf. 2 Reis 7,22). Diante dessa situação, o olhar penetrante de Jesus destrói tudo o que não gera vida e escraviza. O grupo de falsos profetas recebe um tempo para mudar o rumo de suas vidas. (Cf. 2,21-22).

c) Promessa: Ao vencedor é prometido governar as nações e a Estrela da Manhã (cf. 2, 26-29).


5) Sardes: morta em vida

Em Sardes, eram muito conhecidas as confecções de lã. Era a cidade da indústria têxtil. Ela era muito elogiada por sua beleza, aparentando ser uma cidade cheia de vida. Sua segurança, porém, era muito frágil, e o povo se sentia sempre ameaçado, por falta de vigilância em seus muros. Em Sardes, os atletas vencedores eram premiados com vestes brancas. Vamos ler o texto de 3,1-6.

Igreja: As coisas não andavam bem em Sardes. A Igreja está morta. A vida é apenas aparente. Somente uns poucos se mantêm fiéis. Nessa comunidade, é importante o tema da veste: a veste branca, dos mártires, que não se sujaram com a idolatria. Jesus também é mártir e está vestido de branco.

Conteúdo da Carta:

a) Título de Cristo: “Aquele que tem os Sete Espíritos de Deus e as Sete Estrelas” (Cf. 3, 1).

b) Mensagem: A comunidade está viva apenas de nome, pois na realidade está morta. Jesus não descobre nela nada de positivo. Somente algumas pessoas não sujaram a roupa (cf. 3, 4). Cristo exorta a comunidade a acordar, a reforçar o que restou, a conservar o que recebeu e ouviu, a converter-se, e vigiar.

c) Promessa: ao vencedor serão dadas vestes brancas, seu nome não será apagado do livro da Vida e o próprio Jesus Cristo vai falar o seu nome diante do Pai e dos seus Anjos (cf. 3, 5-6).


6) Filadélfia: pobre no espírito

A cidade de Filadélfia é a mais nova das 7 e foi diversas vezes destruída por terremotos, por ter sido construída sobre uma região vulcânica. Seu nome significa “fraternidade”. Aí temos templos dedicados aos imperadores Tibério, Calígula e Vespasiano. A estes eram erguidas colunas com seus nomes. Estudemos o texto de 3,7-13. 2.1)

Igreja: A comunidade de Filadélfia tem muita coisa em comum com a de Esmirna. Contra as duas o Senhor não tem nenhuma repreensão a fazer. A comunidade de Esmirna é pobre, a de Filadélfia é sem poder. As duas têm problemas com a “Sinagoga de Satanás”, e as duas esperam uma crise iminente. Embora tenha pouco poder, encontra sua única força em guardar a Palavra e na fidelidade ao projeto de Jesus.

Conteúdo da Carta

a) Título de Cristo: “Santo, Verdadeiro e que tem a Chave de Davi” (cf. 3, 7).

b) Mensagem: A comunidade de Filadélfia tem pouca força, mas foi Jesus quem abriu para
ela a porta que ninguém poderá fechar (Cf. 3, 8). Esta comunidade pequena e fraca conservou a Palavra e não renegou o nome de Jesus. Por isso, ela não tem nada de negativa.

c) Promessa: O vencedor será colocado como coluna no templo de Deus, onde será gravado o nome de Deus (Cf. 3, 12-13).


7) Laodiceia: morna

Era a cidade mais rica da região. Era conhecida por seus bancos, ('Cidade de Ouro'), sua indústria de linho e de algodão, e por sua escola médica com suas farmácias. Ali se fabricava uma pomada milagrosa para os ouvidos e um famoso colírio para os olhos. Do chão brotavam águas mornas, muito concorridas. Vamos ler atentamente esta carta, em 3, 14-22.

Igreja: a comunidade de Laodiceia é toda negativa. É uma comunidade que não é fria nem quente. O frio simboliza a indiferença do mundo pagão e rico. O quente simboliza o fervor dos cristãos, que são "pobres" ou "humildes no espírito" (Mt 5,3), sempre disponíveis para o Reino de Deus. - Mas os laodicenses querem ser ao mesmo tempo ricos (frios) e cristãos (quentes). Esta comunidade é também marcada pela auto-suficiência e orgulho (cf. 3, 17).

Conteúdo desta carta

a) Título de Cristo: “O Amém, a Testemunha Fiel e Verdadeira, o Principio da Criação de Deus” (cf. 3, 14). Amém significa fidelidade permanente. Jesus é o Amém de Deus.

b) Mensagem: o Senhor não encontra nada de bom na comunidade, por isso diz que ela é morna, cheia de si, infiel, pobre, cega, nua, (cf. 3, 17). Será rejeitada. Mas há solução! É só comprar do ouro que Cristo oferece, vestir-se de suas vestes, usar do seu colírio (cf. 3, 18-19).

c) Promessa: aqui temos uma das mais belas Promessas de Jesus: “Eis que bato à porta; se alguém abrir, entrarei em sua casa e faremos juntos a refeição” (cf. 3,20). Ao vencedor é prometido sentar-se com o Cristo em seu Trono (cf. 3, 21).

Leia a continuação deste estudo

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Bibliografia
1- RICHARD, Pablo. Apocalipse - Reconstrução da Esperança, 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1996.
2- BORTOLINI, Pe. José. Como ler o Apocalipse, Resistir e Denunciar. São Paulo: Paulus, 2008.
3- GALVÃO, Antônio Mesquita. Apocalipse ao Alcance de Todos. São Paulo: O Recado, 2009.
5- CORSINI, Eugênio. O Apocalipse de São João - Grande Comentário Bíblico. São Paulo: Paulinas, 1992.
6- MESTERS, Carlos. Esperança de um Povo que Luta - O Apocalipse de São João, uma Chave de Leitura. São Paulo: Paulus, 1991.

Referência bibliográfica:
Edição Brasileira da Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulinas, 1991.
The New American Bible. Nashville: Catholic Bible Press, 1987.

CARRILLO, S. El Apocalipsis. C. México: Instituto de Pastoral Bíblica, , 1998.

NUTTING, M. And God Say What?. New York: Paulist Press, 1986.

YATES, K. Nociones Esenciales del Hebreo Biblico. New York: Harper & Row Publishers, 1984.


Outras fontes:
RIVERO, Pe. Jordi. Apostolado Veritatis Splendor: A prostituta do Apocalipse, a Grande Babilônia. Disponível em http://www.veritatis.com.br/apologetica/105-igreja-papado/603-a-prostituta-do-apocalipse-a-grande-babilonia desde 11/12/2006; tradução: Carlos Martins Nabeto.

* Este artigo contém trechos baseados em texto do Padre Ademir Nunes Faria.

A Igreja é santa? Como assim?


Este artigo surgiu de um rascunho de resposta a um leitor anônimo que passou a nos enviar, insistentemente, comentários questionando acerca do motivo de o Papa João Paulo II ter pedido perdão pelos "erros da Igreja", em especial aos judeus, por conta do "comportamento da Igreja durante a Segunda Guerra Mundial" (sic). Esses comentários surgiram depois de um outro leitor anônimo ter insinuado que o Papa Pio XII era simpatizante do regime nazista.

Mesmo com diversas respostas, - minhas e dos leitores e colaboradores Lucas Henrique de Oliveira e "Católica", - demonstrando e comprovando (inclusive com referências e indicação bibliográfica) que essas acusações contra o Sumo Pontífice são improcedentes e caluniosas, continuaram os comentários repetidos, insistindo na mesma questão: então por que João Paulo II pediu perdão aos judeus?

Claro que o Papa Pio XII não foi conivente e nem omisso com relação aos crimes nazistas, como alegam os inimigos da Igreja de plantão, e comprovar este fato é muito simples: como lembrou Lucas, até importantes e famosos judeus da época o atestaram, como Albert Einstein, que declarou publicamente: “Só a Igreja Católica protestou contra o assalto hitlerista à liberdade”.

É fato histórico que, em resposta às calúnias, diversos sobreviventes do holocausto nazista, e inclusive destacados rabinos e autoridades israelitas, manifestaram-se em defesa de Pio XII. Não vou me aprofundar nesse tema específico neste artigo, mas adianto que são tantas as citações e referências históricas que provam a inocência e a coragem de Pio XII na luta contra o nazismo e na proteção do povo judeu, que para tratar do assunto como se deve eu teria que produzir pelo menos uns dois outros posts bem extensos.

Entendemos que a questão que realmente confunde a cabeça de quem se apega a essas "picuinhas" é muito mais profunda do que saber se um Papa simpatizava com o nazismo ou não. - Mais adiante entraremos na essência da questão. - Por ora, vou deixar a indicação de um bom livro para os que estiverem honestamente interessados: "Pio XII, o Papa dos Judeus", de Andrea Tornielli, João César das Neves e António Maia da Rocha (Editora Civilização), que pode ser encontrado na Livraria Ecclesiae (veja aqui). Quem quiser ler online um dossiê completo sobre o assunto, pode também acessar a página do jornalista e filósofo (dos bons) Olavo de Carvalho, clicando aqui. Vale a pena.

Mas então, afinal, porque o Papa João Paulo II pediu perdão? Se Pio XII não errou, por que se desculpar? A pergunta parece fazer sentido. Vejamos: em primeiro lugar, é interessante lembrar que esse tal pedido de perdão de João Paulo II gerou controvérsia dentro da Igreja. Nem todos concordaram com essa atitude do Sumo Pontífice, e para falar a verdade, quem mais a festejou foram a mídia modernista e os adversários declarados da Igreja. Acontece que, se por um lado o Papa assumiu uma postura nobre e humildemente cristã, ele sem querer também deu munição aos caluniadores: esse pedido de perdão foi e será sempre explorado pelos que gostam de atacar a Igreja (prova disso são os comentários do leitor anônimo). Ora, só pede perdão quem se sente culpado.

O que falta é esclarecer que o pedido de perdão foi pelos erros humanos dos filhos da Igreja, e não por supostos erros da Igreja num sentido absoluto: a Igreja, enquanto condutora dos cristãos no mundo, enquanto Esposa e Corpo Místico de Cristo, do qual o Senhor é a Cabeça, não erra e nem pode errar, segundo a Promessa dEle mesmo: "As portas do Inferno não prevalecerão contra ela" (Mt 16,18); “Eis que estou convosco até o fim do mundo” (Mt 28,20).

Agora vamos esclarecer a questão do referido pedido de perdão do Papa, de uma vez por todas, antes de entrarmos no problema mais profundo e realmente essencial, como mencionei antes. - Ocorre que, no início da Quaresma do ano 2000, pela primeira vez, todos os pecados do passado dos filhos da Igreja foram citados em conjunto, num documento intitulado "Memória e Reconciliação: a Igreja e as Culpas do Passado", que agrupou as incorreções em blocos que abrangem toda a história da Igreja, incluindo o tópico # pecados contra os judeus.

Certo. E para que possamos entender qual é o sentido da culpa que o Papa está assumindo e pela qual está pedindo perdão, em nome dos Papas e clérigos antes dele, faço questão de reproduzir, abaixo, o trecho do documento que trata especificamente deste assunto. Você, leitor anônimo que insistiu na pergunta, e todos os que tiverem dúvidas a respeito, por favor, leiam com atenção (negritos nossos):

"A Shoah (holocausto) foi certamente resultado de uma ideologia pagã, como era o nazismo, animada de um cruel anti-semitismo, a qual não só desprezava a fé mas também negava a própria dignidade humana do povo hebraico. Contudo, deve-se perguntar se a perseguição do nazismo nos confrontos com os judeus não foi facilitada por preconceitos antijudaicos presentes nas mentes e corações de alguns cristãos. Ofereceram os cristãos toda a assistência possível aos perseguidos e, em particular, aos judeus? (45) Sem dúvida que foram muitos os cristãos que arriscaram a vida para salvar e assistir os judeus seus conhecidos. Parece, porém, igualmente verdade que ao lado destes corajosos homens e mulheres, a resistência espiritual e a ação concreta de outros cristãos não foi aquela que se poderia esperar de discípulos de Cristo.(46) Este fato constitui um apelo à consciência de todos os cristãos, hoje, exigindo um ato de arrependimento,(47) e tornando-se um estímulo a que redobrem os seus esforços para serem 'transformados, adquirindo uma nova mentalidade' (Rm 12,2) e para manterem uma memória moral e religiosa da ferida infligida aos judeus. Nesta área, o muito que já foi feito poderá ser consolidado e aprofundado."
(Documento Memória e Reconciliação: a Igreja e as Culpas do Passado - Comissão Teológica Internacional - para ler direto na página oficial do Vaticano, clique aqui)

Interessante como a realidade é diferente do que pintam por aí, não é mesmo? Pois é... João Paulo II nunca pediu perdão pelos erros de Pio XII, muito menos pelo "comportamento da Igreja" durante a guerra... Ele declara, apenas e tão somente, que alguns cristãos poderiam ter feito mais do que fizeram, e outros possivelmente pecaram por se deixarem levar por preconceitos antissemitas. Ele declara ainda que muito foi feito, mas que pode ser aprofundado. Somente isso.


A questão essencial

Respondida de uma vez a pergunta, encerro por enquanto o assunto Pio XII e Segunda Grande Guerra. Como falei, a questão que se impõe vai muito além disso. A pergunta que precisa ser respondida, para esclarecer de uma vez por todas as mentes das pessoas que fazem (e insistem) nesse tipo de pergunta, é a seguinte: afinal, como a Igreja pode ser santa, se a história está manchada pelos muitos pecados dos católicos, inclusive de Padres, Bispos e Papas? Essa dúvida aparece quando não se sabe exatamente o que Cristo afirmou nas palavras "as portas do inferno não prevalecerão contra ela" (Mt 16, 18).

Para facilitar a compreensão, cabe usar de uma conhecida analogia: conta-se que Napoleão, grande líder militar e vencedor de tantas batalhas, após ter mantido por longo tempo o Papa Pio VII prisioneiro em Fontainebleau, queria tomar a Igreja Católica sob sua tutela, para assim alcançar a hegemonia total na Europa. Com essa ideia em mente, redigiu uma concordata que entregou ao Secretário de Estado da época, Cardeal Consalvi. O imperador disse ao Cardeal que voltaria no dia seguinte e que queria o documento assinado. Depois de ler a concordata, Consalvi informou Sua Santidade de que assinar o documento equivaleria a vender a Igreja ao Imperador da França e, por conseguinte, implorou-lhe que não o assinasse. Quando Napoleão voltou, o Cardeal informou-o de que o documento não havia sido assinado. O imperador começou então a usar um dos seus mais conhecidos estratagemas: a intimidação. Numa explosão de ira, berrou: “Se este documento não for assinado, eu destruirei a Igreja Católica Romana!”; mas Consalvi calmamente replicou: “Majestade, se os Papas, Cardeais, Bispos e Padres não conseguiram destruir a Igreja em dezenove séculos, como Vossa Alteza espera consegui-lo durante os anos da sua vida?”...

Fica claro o sentido das palavras do Cardeal Consalvi nesse episódio. Ele expõe um fato histórico incontestável: apesar dos inumeráveis pecadores no seio da Igreja, ela subsistiu e subsiste através dos séculos, por ser a Esposa de Cristo, Igreja santa e protegida pelo Espírito Santo! Nem todos os maus clérigos puderam fazer com que ela perecesse, e nem poderão. Nem todos os inimigos da Igreja, tantas vezes enrustidos dentro dela mesma, serão capazes de fazê-la tombar! Há dois mil anos, toda sorte de falsos profetas e profetizas gritam que ela vai cair, que vai acabar, e todos eles sempre acabam confusos, humilhados, desementidos, um após o outro...

A Igreja sobrevive e continuará a sobreviver, mesmo com muitíssimos problemas. Precisamos entender que Cristo nunca disse que daria líderes perfeitos à sua Igreja; o Senhor nunca declarou que todos os membros da Igreja seriam santos e irrepreensíveis. Judas era um dos Apóstolos; São Pedro, o primeiro Papa, negou o Mestre por três vezes... E assim continuaram errando e derrapando os filhos da Igreja, em toda a sua história. Mas nosso Senhor disse que o inferno não prevaleceria contra ela e isto vem se cumprindo há dois milênios! O mal rodeia, atrapalha, interfere, maltrata, atenta, infiltra-se... Mas não prevalece! Não vence, não triunfa, não consegue fazer ruir a Igreja, e sempre foi assim.

Muito importante: A palavra “Igreja” tem dois sentidos: um sobrenatural e outro sociológico. Para os não-católicos, a Igreja é uma instituição meramente humana, instituição cuja história está carregada de crimes. É preocupante o fato de que o significado sobrenatural da palavra Igreja, – a saber, a santa e imaculada Esposa de Cristo, – seja totalmente desconhecido por tantas pessoas, e até por um alto percentual de católicos cuja formação religiosa vem sendo negligenciada desde o Concílio Vaticano II.

Por isso, quando o Papa pediu perdão pelos pecados dos cristãos do passado, muita gente se apressou em supor que ele estava assumindo que a Igreja, como um todo, é pecadora, falida, criminosa. – “A instituição religiosa mais poderosa da terra está finalmente admitindo as suas culpas", vibraram muitos, e alguns "viajaram" ainda mais além, supondo que a própria existência da Igreja foi, em algum sentido, prejudicial à humanidade. Isso é um terrível e fatal engano.

Na realidade, é ela mesma, - a Igreja Esposa de Cristo, - a maior vítima dos pecados dos seus filhos; também é ela mesma que implora a Deus pelo perdão dos pecados destes filhos. É a Santa Igreja que implora a Deus que cure as feridas infligidas por aqueles seus filhos que a traíram, muitas vezes em nome da própria Igreja. Por isso a Liturgia Católica é tão rica em orações que invocam o Perdão de Deus. As vítimas dos pecados podem (e devem) perdoar o mal que sofreram, mas não podem de forma alguma perdoar o mal moral em si.

A Santa Igreja Católica não peca, mas muitas vezes é a mãe dolorosa de filhos rebeldes, orgulhosos e desobedientes. Ela dá-lhes os meios de salvação, dá-lhes a conhecer o Caminho da Verdade, mas não pode forçá-los a viver os seus santos ensinamentos, a praticar o que ela ensina, e isto aplica-se a todo o Corpo Eclesial, em toda a sua história. Cristo foi traído por um dos seus Apóstolos e negado por outro, mas aí mesmo podemos ver a diferença fundamental entre santidade e rebeldia: o primeiro enforcou-se; o segundo arrependeu-se, chorou amargamente e depois assumiu a sua missão como Apóstolo e condutor da Igreja, dedicando-se de corpo e alma, até o fim da vida, pelo bem da Igreja.

A distinção entre o sentido sobrenatural e o sentido sociológico da Igreja deve ser continuamente enfatizada, pois fatalmente causa confusão quando não é explicada com clareza.

Os que se declaram católicos mas pisoteiam a doutrina católica são traidores, e isto deveria ser muito simples de entender. A Igreja deve ser julgada, obviamente, com base naqueles que vivem os seus ensinamentos, e não naqueles que os traem: isso é justiça.

A Profª Alice von Hildebrand (Hunter College da City University de New York) testemunha que um certo judeu ortodoxo, seu colega, lamentava o fato de muitos judeus se tornarem ateus, dizendo: “Se somente um judeu permanecer fiel, esse judeu é Israel”. Ora, o princípio está certíssimo, e o mesmo pode ser dito com relação à Igreja Católica: é evidente que apenas as pessoas fiéis ao ensinamento da Igreja é que podem falar em seu nome, e jamais aqueles que agem contra o que a Igreja prega como princípio.

Os pecadores, aliás, estão igualmente distribuídos pelo mundo, em todas as nações, religiões e instituições, e não são exclusividade dos católicos. Sendo assim, porque é a Igreja Católica o principal alvo dos inimigos da religião em geral? Vemos aí o cumprimento explícito de uma certa profecia de Jesus Cristo, contida no Evangelho segundo S. Lucas (21,17). Sim. Sempre fomos e seremos odiados por amor ao seu Nome.

Somente quem enxerga a Santa Igreja Católica (chamada santa cada vez que o Credo é recitado) com os olhos da fé compreende, com imensa gratidão, que a Igreja é a Santa Esposa de Cristo, sem ruga nem mácula, por causa da santidade do seu ensinamento, pois a Igreja está naquilo que ensina e representa, e não nos que a traem. A Igreja é santa porque aponta o caminho da Vida Eterna e porque é através dela que temos os meios da Graça, ou seja, os Sacramentos.

O pecado é sempre uma realidade medonha, e os pecados cometidos por aqueles que se dizem servos de Deus são especialmente repulsivos; nunca serão excessivamente lamentados, mas devemos lembrar sempre que, apesar de muitos membros da Igreja serem, infelizmente, cidadãos da cidade dos homens e não da Cidade de Deus, a Igreja permanece santa.


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Parte deste artigo é baseado em texto de Alice von Hildebrand, Professora Emérita de Filosofia do Hunter College da City University de Nova York. É autora de diversos livros, entre os quais os mais recentes são: “The Soul of a Lion” (Ignatius Press), sobre o seu falecido marido, o célebre filósofo Dietrich von Hildebrand; “The Privilege of Being a Woman” (Sapientia Press); e “By Love Refined” (Sophia Institute Press).

Fonte: Homiletic and Pastoral Review, disponível em:
http://catholic.net/rcc/Periodicals/Homiletic/2000-06/vonhildebrand.html. Acesso em 3 jun 2011

Resposta ao leitor: o Magistério, a Tradição Apostólica e as Escrituras

Jesus, ainda menino, ensina aos doutores do Templo o sentido das Escrituras Hebraicas

Para a minha triste surpresa, encontrei hoje neste blog o seguinte comentário, deixado no post “Origem da devoção à Virgem Maria”, por um leitor que se identifica com o pseudônimo “Protestante”:


“Lucas e Herinque, não quer dizer que tudo que os primeiros cristãos faziam era inspirado por pelo o Espírito Santo, só porque está escrito nas catatumbas não quer dizer que era o correto, temos que observar o que está escrito na bíblia e que o Apóstolos orientavam e mesmo assim com cautela, pois mesmo eles podem em algum momento sair da direção que o Senhor gostaria que eles seguissem, lembrem-se que todos cometeram falhas com exceção de Cristo.”


Prezado Protestante,

Você está dizendo que a pregação dos Apóstolos não é confiável. Está afirmando que o testemunho da Igreja primitiva não importa. A partir daí, o que percebo, muito claramente, é que para você a única regra que vale é a palavra do “pastor” protestante, e nada mais. Ora, se o que os Apóstolos pregaram não tem valor, e o que a História e a própria Bíblia nos mostram sobre as práticas da Igreja primitiva não têm valor, logo, o que a Bíblia Sagrada atesta também não tem valor. A única coisa que tem valor e deve ser observada fielmente, segundo o seu pensamento, é a pregação do “pastor”, do alto do púlpito! É um caso explícito de idolatria a um ser humano, como se fosse um deus, com poderes absolutos sobre a própria Verdade!

Então, tente perceber que você faz exatamente aquilo de que muitos protestantes acusam os católicos: você segue tradições de homens. Mas por favor não se ofenda. Antes que você procure algum argumento para tentar negar o que estou afirmando, eu vou demonstrar e provar o que estou dizendo, na viva e mais sincera esperança de que você compreenda:

Em primeiro lugar, não há nenhum sentido em dizer que, para compreender a Verdade, a Bíblia vale, e a pregação dos Apóstolos não vale, simplesmente porque (atenção agora) foram os Apóstolos que, direta ou indiretamente, escreveram o Novo Testamento da Bíblia! Em outras palavras, não existiria a Bíblia Cristã se não existissem os Apóstolos. Entende isto? Os Apóstolos não liam a Bíblia para conhecer e saber como seguir o Caminho (até porque a Bíblia Cristã ainda não existia naquele tempo); ao contrário, eles escreveram a Bíblia para que a Igreja soubesse como seguir o Caminho, - que é o próprio Senhor Jesus Cristo.

Fazendo um exercício imaginário, se você entrasse numa "máquina do tempo", voltasse ao primeiro século de nossa era, encontrasse os Apóstolos e dissesse a eles que, para seguir Jesus, confia única e exclusivamente na “Palavra de Deus”, referindo-se às Escrituras, eles lhe dariam um belo puxão de orelhas! Para os Apóstolos, como também em todo o contexto bíblico, a Palavra de Deus é o próprio Cristo, como o Apóstolo João escreveu logo no primeiro capítulo do seu Evangelho. Os Apóstolos viram, ouviram, tocaram e conviveram com a Palavra de Deus em Pessoa: “O que era desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com os nossos olhos, o que contemplamos e nossas mãos apalparam a respeito da Palavra da Vida (...) o que vimos e ouvimos, isto vos anunciamos, para que tenhais comunhão conosco” (1Jo 1,1-3).

Então, sendo que os Apóstolos nos deram a Bíblia, - e não o contrário, - não há sentido em dizer que a Bíblia é confiável e os Apóstolos não. Logo, se os Apóstolos não são confiáveis, a Bíblia também não é, já que a Bíblia foi escrita pelos Apóstolos, que eram inspirados por Deus!

E se eram inspirados por Deus para escrever, não eram inspirados também para pregar, para orientar e conduzir a Igreja de Cristo, aquela mesma Igreja junto à qual o Senhor prometeu que estaria até o fim do mundo (Mt 28,20)? Não foi esta Igreja edificada pelo Senhor? E o mesmo Senhor não prometeu que as portas do Inferno jamais prevaleceriam contra ela (Mt 16,18)? Então, se o Senhor prometeu que estaria para sempre com a Igreja, e que o Inferno não prevaleceria contra ela, - e essa Igreja era conduzida pelos Apóstolos, - evidentemente os Apóstolos tinham que ser conduzidos também pelo Senhor! Consegue entender isto? É óbvio, é claro como água!

Se você afirma que os Apóstolos não eram totalmente confiáveis na condução da Igreja, então você está dizendo 
que a Bíblia também não é confiável, e que o Senhor falhou; primeiro porque a Bíblia Cristã foi escrita pelos Apóstolos, segundo porque está escrito nesta mesma Bíblia que Jesus Cristo, diretamente, deu autoridade a estes Apóstolos sobre a Igreja, até para ligar e desligar na Terra o que será ligado ou desligado no Céu, e até mesmo para perdoar ou não perdoar os nossos pecados! (Jo 20,23 / Mt 18,18)...

A argumentação que eu lhe apresentei até aqui, em Teologia, é chamada de “Argumento Invencível”, pois não há saída, não há como contrariá-la. Não é possível você dizer que os Apóstolos foram infalíveis para escrever os Evangelhos, os Atos e as Epístolas, mas não eram infalíveis para pregar e conduzir os primeiros cristãos, porque a Bíblia mesmo afirma o contrário, quando diz que Jesus estava com a Igreja, que o Inferno não prevaleceria contra a Igreja e que dava aos Apóstolos autoridade sobre a Igreja.


É exatamente a mesma coisa quando falamos do Papa, hoje, e a confusão dos protestantes também é exatamente a mesma: o Papa, como sucessor de Pedro, é um homem imperfeito e falho, sujeito ao pecado como qualquer um de nós, assim como foram os Apóstolos. Nós não cremos nos Apóstolos e nem no Papa como infalíveis, no sentido de serem perfeitos e intocáveis: cremos que, quando no exercício sagrado da condução da Igreja, aí sim eles são infalíveis. Cremos nisso porque cremos na Promessa de Cristo, que disse aos seus Apóstolos: “Eis que estou convosco até o fim do mundo” (Mt 28,20).

Bem, o fim do mundo ainda não chegou, e a Igreja continua a sua missão de levar o Evangelho a toda criatura (Mc 16,15). - Então, se eu creio em Jesus e creio nas Escrituras, preciso crer que Ele ainda está Presente no meio da Igreja (Ap 2,1), sendo a Cabeça da Igreja, que é o seu Corpo na Terra (1Cor 12,27 / Ef 4,12 / Rm 12,5). - E se Cristo é a Cabeça que conduz o Corpo, então eu não posso afirmar que a Igreja foi corrompida, desviada, nem que aquilo que a Igreja ensina esteja errado, pois ela não pode jamais desviar aqueles que buscam a Verdade: é esta a Promessa de Cristo!

Sim, filhos da Igreja podem se desviar, podem pecar e se corromper, e levar outros a fazerem o mesmo: infelizmente, isso é notório. Mas um filho da Igreja que se perde não representa a Igreja como um todo; assim também não podemos derrubar toda uma imensa árvore, que sempre deu magníficos frutos, porque alguns poucos frutos (dentro do total) foram bicados pelos pássaros.

Mas tudo o que eu falei até aqui representa um só ponto da questão. A melhor maneira de convencer alguém que foi condicionado a acreditar que somente aquilo que está escrito na Bíblia pode ser levado em consideração (a famigerada doutrina da sola scriputra), é apontando e mostrando o que a própria Bíblia tem a dizer a respeito.

Por isso, eu costumo repetir sempre certas passagens a todos os que vêm aqui repetir a cartilha da sola scriputra (e são muitos), e quem acompanha este blog já sabe disso. Você pode ler algumas dessas repostas aqui e aqui, e ver um bom exemplo do tipo de fruto que a sola scriptura costuma dar aqui, por exemplo. Se você fizer uma pesquisa em nosso “Índice de respostas católicas a acusações protestantes e 'evangélicas'", encontrará material abundante sobre esses temas.

Mesmo assim, meu querido leitor Protestante, faço questão de publicar mais uma vez (pois temos que ser incansáveis na defesa da Verdade e na prática do bem, conforme diz o Apóstolo em Gl 6,9) o que a Bíblia Sagrada tem a dizer sobre a doutrina que diz que devemos observar somente o que dizem as Escrituras:

Em João 5, 39:
“Vós examinais as Escrituras, julgando encontrar nelas a vida eterna. Pois bem! São elas mesmas que dão testemunho de mim. E vós não quereis vir a mim para que tenhais a vida!”

Aí está Jesus Cristo, na Bíblia Sagrada, declarando categoricamente que Ele não pode ser encontrado somente através das Escrituras.

Em 1 Timóteo 3, 15:
“...Quero que saibas como deves portar-te na casa de Deus, que é a Igreja do Deus vivo, coluna e sustentáculo da Verdade.”

O Apóstolo Paulo define a Igreja como a coluna e o sustentáculo (ou a firmeza e o fundamento, segundo outras traduções) da Verdade. Em nenhum lugar da Bíblia está escrito que a Escritura é, sozinha, o fundamento da Verdade, mas sim a Igreja de Cristo.

Em 2Pedro 1, 20:
“Sabei primeiramente isto: que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação particular.”

Mais uma vez, a Escritura é mais do que direta, e qualquer um que não seja cego ou não use uma venda nos olhos pode ver: primeiramente entendam que as profecias da Escritura não são de interpretação particular, isto é, não foram escritas para qualquer pessoa ler e interpretar "do seu jeito", usando-as para qualquer fim, inclusive justificar os maiores absurdos, como temos visto ultimamente, desde a defesa do aborto até a invenção da "teologia da prosperidade".

Em 2 Tessalonicenses 2, 15:
"Então, irmãos, estai firmes e guardai a Tradição que vos foi ensinada, seja por palavras, seja por epístola nossa."

Aí está o Apóstolo Paulo declarando, objetivamente, que devemos guardar não somente o que está escrito (as epístolas dos Apóstolos formam a maior parte do Novo Testamento da Bíblia), mas também a Tradição Apostólica.

Em 2 Tessalonicenses 3, 6:
"Mandamo-vos, porém, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que vos aparteis de todo o irmão que anda desordenadamente, e não segundo a Tradição que de nós recebeu."

Apartai-vos de todo irmão que não anda segundo a Tradição da Igreja! O que mais é preciso que a Bíblia diga, para que alguém se convença da falsidade da doutrina da sola scriptura?


Bem, meu caríssimo leitor Protestante, eu lhe mostrei e provei biblicamente que o Magistério e a Tradição dos Apóstolos são, no mínimo, tão fundamentais para a Igreja quanto as Escrituras. Mais do que isso, esses três pilares do Cristianismo se integram, se completam e conferem sentido um ao outro. A Igreja de Cristo se fundamenta igualmente nestes três princípios, estes três apoios. Assim como uma estrutura não pode se manter estável se estiver fundamentada em apenas um apoio, assim também a Igreja. Isolar as Escrituras, para utilizá-las como única regra de fé e prática, é o primeiro e maior erro dos protestantes.

Esperando que minha resposta possa ter auxiliado no esclarecimento destas questões, ou ao menos que eu tenha conseguido fazer pensar, concluo fraternalmente, em Cristo.

Henrique Sebastião

Simbolismo e significados do Apocalipse: interpretação exegética do Livro da Revelação - parte 2

Leia a primeira parte deste estudo aqui

Logo no início da leitura do Livro do Apocalipse ficamos sabendo da situação do Apóstolo João: ele está preso na Ilha de Patmos por causa da Palavra de Deus e de seu testemunho. Porém, ele continua unido às comunidades da Igreja, como irmão e companheiro. Tanto João quanto as comunidades vivem momentos difíceis, passando por perseguições e tribulações. Mas, assim como Jesus venceu, a fé da Igreja é que, com Ele, também ela vencerá.



A grande experiência mística de João, relatada no Livro do Apocalipse, acontece no “Dia do Senhor”, isto é, no domingo, dia em que os Cristãos sempre se reuniram para celebrar o Sacrifício e Vitória de Jesus Cristo sobre a morte. A experiência acontece por meio do Santo Espírito, o mesmo que moveu os profetas do passado e o próprio Jesus.

Primeiro João ouve uma “Voz forte” que lhe dá uma ordem. Depois ele vê sete candelabros de ouro: candelabros ou castiçais são usados no culto, na celebração cristã, desde o início da cristandade; eles são de ouro, metal usado para prestar culto a Deus desde os tempos do Antigo Testamento; são “sete”, pois nesse caso representam as comunidades da Igreja e, ao mesmo tempo a totalidade da mesma Igreja (como vimos em nosso estudo anterior, que você pode conferir aqui). E João vê “Alguém”, certamente Jesus Cristo, com as seguintes características:


A Glória do Cristo nos símbolos do Apocalipse de João

# É Juiz = Filho do homem;
# Usa túnica longa = É o Sumo Sacerdote;
# É Rei = Usa o cinto de ouro;
# Tem cabelos brancos = É Divino e possui a Eternidade;
# Tem Olhos de Fogo = Tudo vê e penetra com seu Olhar;
# Tem "Pés de bronze" = É estável, firme, forte;
# Tem Voz forte = Cristo é Poderoso; não há o que temer; Ele transmite segurança;
# Mão direita com sete Estrelas = Ele é nosso protetor e nos conduz;
# Traz uma Espada afiada = Tem a revelação da Verdade, a Boa Nova de Deus para a salvação do mundo;
# Sua Face brilha = Cristo nos ilumina.

A "túnica longa e o cinto de ouro no peito” são as vestes usadas pelo Sumo Sacerdote Hebreu (cf. Ex. 28,4; 29,5; Lv 8,7), também usada pelos reis e seus amigos (cf. I Mc 10, 89; 11,58). São símbolos da Realeza e do Sacerdócio de Cristo. Os “Olhos flamejantes" e a "espada afiada" dizem que o Cristo tem a capacidade de penetrar nos mais obscuros segredos e de distinguir entre o bem e o mal. Ele é também Juiz, veio trazer julgamento.

As sete cartas, que temos nos capítulos 2 e 3, são um apelo para que as comunidades convertam-se verdadeiramente, profundamente, espiritualmente. Jesus está vivo no meio delas (2,1) e têm os responsáveis de cada comunidade (as sete estrelas) em sua mão direita. As comunidades do Apocalipse são como as de hoje: todas elas muito diferentes e com problemas específicos. A cada uma Jesus se apresenta de forma diferenciada e particular.

O Cristo conhece a vida de cada uma, reconhece o bem, repreende o mal, elogia, dá conselhos, ameaça e promete um prêmio final. As Comunidades de Esmirna e Filadélfia são as mais próximas da perfeição. A de Pérgamo é boa e má ao mesmo tempo. A de Sardes, salvo uns poucos, é toda negativa. Por último, a de Laodicéia é um desastre. Apesar disso, motivo de nossa esperança Jesus Cristo se dirige a todas elas com o mesmo Amor Divino.

As cartas seguem um esquema composto de Cinco passos:

I) Em primeiro lugar vem a identificação, o endereço: “Escreve ao Anjo da Igreja...”;
II) Depois temos a apresentação de Jesus Cristo, que inicia sempre com as palavras “assim diz Aquele que segura as sete estrelas na sua mão direita, ou Aquele que tem os sete Espíritos de Deus e as sete estrelas, etc.”;
III) A seguir vem o julgamento da comunidade, que inicia sempre com a Palavra “Conheço a tua conduta...”. E aponta as coisas boas e ruins de cada uma;
IV) Em quarto lugar temos um apelo particular a cada comunidade, por exemplo, “Presta atenção... (2,5), não tenhas medo ...”(2,10).
V) Por último, vem a promessa ao vencedor.

Para uma melhor compreensão do texto bíblico, antes de ler cada “carta”, é importante que conheçamos um pouco sobre cada cidade, conforme veremos em nosso próximo estudo. Até lá!

Leia a continuação deste estudo

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Bibliografia
1- RICHARD, Pablo. Apocalipse - Reconstrução da Esperança, 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1996.
2- BORTOLINI, Pe. José. Como ler o Apocalipse, Resistir e Denunciar. São Paulo: Paulus, 2008.
3- GALVÃO, Antônio Mesquita. Apocalipse ao Alcance de Todos. São Paulo: O Recado, 2009.
5- CORSINI, Eugênio. O Apocalipse de São João - Grande Comentário Bíblico. São Paulo: Paulinas, 1992.
6- MESTERS, Carlos. Esperança de um Povo que Luta - O Apocalipse de São João, uma Chave de Leitura. São Paulo: Paulus, 1991.

Referência bibliográfica:
Edição Brasileira da Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulinas, 1991.
The New American Bible. Nashville: Catholic Bible Press, 1987.
CARRILLO, S. El Apocalipsis. C. México: Instituto de Pastoral Bíblica, , 1998.
NUTTING, M. And God Say What?. New York: Paulist Press, 1986.
YATES, K. Nociones Esenciales del Hebreo Biblico. New York: Harper & Row Publishers, 1984.

Outras fontes:
RIVERO, Pe. Jordi. Apostolado Veritatis Splendor: A prostituta do Apocalipse, a Grande Babilônia. Disponível em http://www.veritatis.com.br/apologetica/105-igreja-papado/603-a-prostituta-do-apocalipse-a-grande-babilonia desde 11/12/2006; tradução: Carlos Martins Nabeto.

* Este artigo contém trechos baseados em texto do Padre Ademir Nunes Faria.

Simbolismo e significados do Apocalipse


Interpretação exegética do Livro da Revelação - parte 1

O Apocalipse, cujo título no grego é αποκάλυψις (apokálypsis), que significa "revelação" (traduzido literalmente: 'tirar o véu'), é o último livro da Bíblia Sagrada. Complexo e profundamente místico, está repleto de símbolos, alegorias e comparações. Trata-se de uma leitura extremamente difícil, até para teólogos e pesquisadores gabaritados. A compreensão deste livro, sem dúvida, está além do alcance do leigo comum e também dos curiosos em geral. Por isso mesmo, é mais fácil cair na tentação de manipular certas passagens, deturpando-as e usando-as fora de contexto, para justificar qualquer opinião pessoal.

Como é de conhecimento geral, certos embusteiros da fé têm usado desses artifícios desonestos para atacar a Igreja de Cristo, chegando a dizer que é a Igreja a "Prostituta" e/ou a "Grande Babilônia", e o Papa a "Besta" citados no livro do Apocalipse. Para começarmos a ler um pouco melhor este livro tão difícil, é essencial possuirmos algum conhecimento exegético prévio. Com este artigo, pretendemos ao menos lançar alguma luz sobre o tema e abrir caminhos para uma leitura mais madura e realista de um texto sagrado tão maltratado e manipulado por ignorantes e desonestos.

Para muitos, o Apocalipse é um livro que fala somente de destruição, catástrofe e fim do mundo. Ao iniciar a sua leitura, não são poucos aqueles que, impressionados, assustam-se e desistem. Outros tantos utilizam os textos para caluniar pessoas e religiões. A verdade inegável é que a linguagem do Apocalipse é estranha para o leigo, saturada de simbolismos e alegorias desconhecidas. Raros são aqueles que sabem por onde começar a decifrá-lo.

Temas como a Besta do Apocalipse (na realidade são duas Bestas, a primeira e a segunda), o Anticristo e o número 666, entre outros, têm sido motivo de muita confusão, sempre aumentada por espetaculares produções cinematográficas que tratam o assunto com total liberdade (e irresponsabilidade). Não são poucos os que se apressam em apontar, nos tempos atuais, algum "anti-Cristo" ao qual poderiam ser atribuídas as descrições do Apocalipse: com inquieta curiosidade e sem nenhum receio, especulam ansiosamente, com muito atrevimento mas sem fundamentar as supostas evidências que enxergam por todos os lados. Nos acontecimentos dos nossos tempos, enxergam suas próprias "verdades" sobre toda a simbologia contida no Livro da Revelação, sem desconfiar que seus reais significados estão vinculados a um outro tempo específico, dentro de contextos históricos alheios à atualidade.


Considerações gerais

Para começar este trabalho exegético, consideramos importante explicar alguns elementos que servem como material sólido (e historicamente correto) para interpretar o texto. Optamos pela tradução bíblica da edição brasileira da Bíblia de Jerusalém.


Gênero literário

O Livro da Revelação, Apocalipse de João ou ainda Apocalipse de Jesus Cristo segundo João, corresponde, precisamente, ao gênero literário denominado "apocalíptico", que floresceu na literatura hebraica por quatro séculos, de 2aC até 2dC. A literatura apocalíptica depende da literatura profética e da sapiencial. Porém, diferentemente da literatura profética, onde o elemento essencial é "a Palavra", na apocalíptica o elemento essencial é "a Visão". Outra característica do gênero apocalíptico é o uso abundante de símbolos.

A estrutura de um texto apocalíptico divide-se sempre em três fases:
1. Uma etapa de opressão ao Povo de Deus;
2. Uma etapa de castigo e destruição do inimigo;
3. Uma etapa de libertação, vitória e domínio do Povo de Deus.

No Apocalipse, é importante distinguir o ensinamento, que há por detrás da Visão, do relato que narra a Visão. O conteúdo apocalíptico é escatológico ao invés de histórico, motivo pelo qual o seu ensino perdura até o fim dos tempos. No entanto, em sua dimensão histórica, o relato se refere a um tempo concreto, específico. É sob essa ótica que o Apocalipse deve ser interpretado, se quisermos obter o correto entendimento dos seus significados. Além disso, mediante uma boa hermenêutica, podemos proceder a uma constante atualização do seu conteúdo doutrinário.

No Antigo ou Primeiro Testamento (AT) encontramos literatura apocalíptica em Isaías, Ezequiel, Judite, Zacarias e Daniel. No Novo Testamento, encontramos textos apocalípticos em Marcos, Mateus e Lucas, quando narram o discurso escatológico de Jesus; em algumas passagens paulinas, nas epístolas aos Tessalonicenses e 1Coríntios; e, finalmente, como é óbvio, no próprio livro da Revelação ou Apocalipse.


Chaves de interpretação

Para entender mais perfeitamente o conteúdo do livro do Apocalipse, é necessário primeiro conhecer o conteúdo e os símbolos contidos no livro do profeta Daniel; por sua vez, para entender os símbolos de Daniel, é preciso conhecer e entender os símbolos usados pelo profeta Ezequiel; para entender o significado da segunda Besta, é imprescindível compreender o significado da primeira Besta, e assim por diante. Esse procedimento coeso é de fundamental importância no estudo. Ao compreendermos os simbolismos de Ezequiel e Daniel, por exemplo, a exegese do Apocalipse de João resulta em um processo mais simples e natural. Oferecer a interpretação de toda esta simbologia está fora do alcance deste nosso trabalho: esta observação visa conscientizar o estudioso que deseja realmente aprofundar-se no tema por conta própria.

Os Apocalipses (pois existem diversos) foram desenvolvidos numa época de opressão. No caso concreto do Apocalipse de João, foi escrito no ano 95, segundo a opinião majoritária. Nesse tempo, Domiciano exigia o "culto imperial", ainda mais que seus predecessores Vespasiano e Tito. É neste contexto histórico que devemos buscar o verdadeiro significado dos simbolismos empregados por João.


Simbologia dos números no Apocalipse

Todos os números usados no Apocalipse têm significado específico. Conhecê-los ajuda a entender os símbolos do texto. Neste primeiro momento de estudo, convém conhecer os seguintes:

Número 2 - Significa solidez, é usado para reforçar uma determinada realidade; como por exemplo: 2 testemunhas, 2 chifres, etc.;
Número 3 - Perfeição;
Número 6 - Um a menos que o 7; significa imperfeição;
Número 7 - Plenitude, totalidade, inteireza;
Número 666 - O célebre e enigmático "número do Anticristo", que já deu margem a tantas e diversas interpretações, muitas absurdas, designa 3 vezes o número 6, isto é, a máxima imperfeição, a oposto absoluto daquilo que é perfeito.


Breve resumo do Livro do Apocalipse


Logo ao abrir o Livro da Revelação, os três primeiros versículos são um resumo de tudo o que encontraremos adiante. É a porta de entrada da “casa”: a primeira palavra que aparece é “revelação”. A principal finalidade do livro é motivar à resistência, porque os primeiros cristãos viviam tempos muito difíceis. Vemos que a Revelação vem de Deus, por meio de Jesus, para seus servos. Os servos de Jesus são os seus seguidores e profetas.

O Apocalipse é um livro urgente. Não foi escrito para que, ao lê-lo, pudéssemos prever o futuro, mas sim para motivar pessoas a resistirem à opressão e a serem profetas e profetizas, pelo bem da Igreja. O que encontramos no Apocalipse são sinais, e a função do sinal é apontar para algo que ainda não vemos: o caminho que precisa ser percorrido.

O Apocalipse está repleto de Anjos. Quem são? Num primeiro momento são os representantes de Deus, que comunicam algo ou uma missão especial. Num segundo momento, representam os responsáveis pelas "igrejas", que são as comunidades da Igreja então existentes. Outro tema que já aparece no início do livro é o valor e a importância do testemunho dos santos; no texto original em grego, martiria, que nesse contexto significa testemunhar Jesus, Deus feito homem que foi morto, ressuscitou e venceu a morte, tornando-se Senhor da História e da Vida. O Apocalipse é também um livro da felicidade: já no início, anuncia a primeira bem-aventurança: "Feliz aquele que lê e escuta as palavras desta profecia" (1,3).


"Sete igrejas"?

Assim como as nossas celebrações católicas, até hoje, iniciam-se com a saudação: “A Graça e Paz de Nosso Senhor Jesus Cristo estejam convosco...”, João inicia o seu Apocalipse da mesma maneira(1,4-8). João faz essa Saudação às "sete igrejas" da Ásia, e aqui cabe um esclarecimento importantíssimo: a doutrina católica ensina que só há uma Igreja de Cristo, una e indivisível. O Livro do Apocalipse, no entanto, menciona a existência de sete igrejas, somente na Ásia, já naquele tempo. Alguns membros de comunidades ditas pentecostais e neopentecostais, assim como de diversas novas seitas autodenominadas "cristãs", vêm interpretando essas citações do Apocalipse como se constituíssem uma suposta "prova" de que a Igreja de Cristo não é uma só. Para estes, as menções às "sete igrejas" demonstrariam que, desde o princípio, não houve uma só Igreja, e sim uma diversidade de "igrejas" diferentes e independentes entre si, unidas apenas pela fé na Ressurreição de Jesus e na observação das Escrituras.

Na realidade, essa concepção é totalmente equivocada: tanto teologicamente quanto historicamente falando, nada poderia ser mais falso. Se cremos na Bíblia como Sagrada, como Palavra inspirada por Deus, precisamos crer nela como um conjunto coerente e harmonioso, cujos livros se integram e complementam para proclamar a única Mensagem Divina para toda a humanidade. Sendo assim, a Bíblia não pode proclamar uma Verdade Revelada numa página e, logo a seguir, negar ou contrariar esta mesma Verdade em outra página. Analisemos a questão observando esta coerência da hermenêutica bíblica:

No Evangelho segundo Lucas, Jesus mesmo diz que "todo reino dividido contra si mesmo acaba em ruínas" (Lc 11,17). Na Carta aos Efésios, o Apóstolo Paulo afirma que só há uma Igreja, que é Una, pois existe em "um só Corpo e um só Espírito", que professa "um só Senhor, um só Batismo e uma só Fé" (Ef 4,5). Logo, se existissem apenas duas "igrejas" diferentes, com doutrinas diferentes e "batismos" próprios, necessariamente uma delas não poderia ser a autêntica Igreja de Jesus Cristo. No entanto, o que vemos hoje são muitos milhares de "igrejas", uma verdadeira infinidade de denominações ditas "cristãs", cada qual proclamando um tipo de fé completamente diferente das demais. Dentre estas, algumas dizem que o batismo não é condição para a salvação, outras dizem que sem o batismo ninguém se salva; algumas aceitam o divórcio, outras não; algumas praticam o que chamam de "santa ceia", outras não; algumas pregam a famigerada "teologia da prosperidade", outras a condenam; etc, etc...

Fica, portanto, evidente que só pode haver uma única Igreja de Cristo autêntica, e esta Igreja só pode ser a mais antiga, a única que provém dos Apóstolos e guarda a sua Tradição, conforme eles mesmos nos orientaram: "Mandamo-vos, porém, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que vos aparteis de todo irmão que não anda segundo a tradição que de nós recebeu" (2Ts 3,6). A Igreja original precisa ser aquela por meio da qual Jesus se dá no Pão e no Vinho, Igreja que se reúne em torno da Sagrada Eucaristia (conf. 1Cor 11,29). Precisa ser a Igreja que cumpre a profecia de Maria Santíssima, que, cheia do Espírito Santo, declarou de si mesma: "Todas as gerações me chamarão Bem-aventurada" (Lc 1, 48). Através do estudo aprofundado da Bíblia Sagrada, vemos claramente que a Igreja de Jesus Cristo só pode ser a Igreja Católica Apostólica Romana, e nenhuma outra. Mas, sendo assim, como explicar a menção às "sete igrejas" no Apocalipse?

Como já vimos, no contexto do Apocalipse, o número 7 significa totalidade, plenitude; Segundo este princípio, o texto alude a sete anjos, sete cartas, sete selos, sete montes, sete trombetas, sete reis, sete candelabros, sete estrelas, etc... e também sete "igrejas". Tudo isso indica totalidade: a mensagem é dirigida à Igreja de Cristo em sua totalidade, a todos os filhos e filhas da Igreja, a todos os membros do Corpo Místico de Cristo, que é a própria Igreja, representada nas "sete igrejas" da Ásia.

Quando fala em "sete igrejas", o autor se refere às diferentes comunidades da única Igreja situadas nas localidades de Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodiceia, de modo muito semelhante ao qual, atualmente, nos referimos às nossas muitas comunidades ou paróquias, dizendo, por exemplo: "visitei a 'Igreja da Sé'", ou "conheci a 'igreja da Natividade do Senhor de Caruarú'".

Não está errado dizer "Igreja da Sé", e "Igreja da Natividade do Senhor", mas não são igrejas diferentes, distintas, independentes uma da outra, e sim comunidades irmãs que pertencem a uma única Igreja, que é Católica (Universal), Apostólica (procede dos Apóstolos) e Romana (somente porque a sua sede primacial, isto é, o endereço físico do sucessor de Pedro, está localizado em Roma).

Uma outra maneira de comprovar essa realidade é observar que, de do mesmo modo, ainda que todo o conjunto dos textos da Bíblia afirme e reafirme, insistentemente, que há um só Deus, que é Pai, Filho e Espírito Santo, sendo o Espírito Santo o responsável por todas as experiências de Deus no Apocalipse, João fala dos “Sete Espíritos de Deus” (Ap 4,5). - Assim como no caso da Igreja de Cristo, o texto também salienta a Plenitude do Espírito Santo, que é Um só, - através do número que representa a totalidade e a plenitude: uma Igreja, representada por "sete igrejas", um Espírito, representado por "sete Espíritos".

Continua aqui

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Bibliografia
1- RICHARD, Pablo. Apocalipse - Reconstrução da Esperança, 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1996.
2- BORTOLINI, Pe. José. Como ler o Apocalipse, Resistir e Denunciar. São Paulo: Paulus, 2008.
3- GALVÃO, Antônio Mesquita. Apocalipse ao Alcance de Todos. São Paulo: O Recado, 2009.
4- CORSINI, Eugênio. O Apocalipse de São João - Grande Comentário Bíblico. São Paulo: Paulinas, 1992.


Referência bibliográfica:
* Edição Brasileira da Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulinas, 1991.
** The New American Bible. Nashville: Catholic Bible Press, 1987.
*** CARRILLO, S. El Apocalipsis. C. México: Instituto de Pastoral Bíblica, , 1998.
**** NUTTING, M. And God Say What?. New York: Paulist Press, 1986.
***** YATES, K. Nociones Esenciales del Hebreo Biblico. New York: Harper & Row Publishers, 1984.

Outras fontes:
RIVERO, Pe. Jordi. Apostolado Veritatis Splendor: A prostituta do Apocalipse, a Grande Babilônia. Disponível em http://www.veritatis.com.br/apologetica/105-igreja-papado/603-a-prostituta-do-apocalipse-a-grande-babilonia desde 11/12/2006; tradução: Carlos Martins Nabeto.

* Este artigo contém trechos baseados em texto do Padre Ademir Nunes Faria
vozdaigreja.blogspot.com

Pedro, o primeiro Papa


Hoje, gostaria de compartilhar algo com os leitores deste blog. Nada muito especial, e nada que este apostolado já não tenha esclarecido em postagens anteriores, mas acho que valer a pena a postagem, pois nunca é demais esclarecer dúvidas e defender a verdade, como diz a primeira carta de São Pedro: "Estai sempre prontos a responder para vossa defesa a todo aquele que vos pedir a razão de vossa esperança." (I Pedro 3,15)

Ocorre que, em meio a uma pesquisa no Youtube, dei de cara com um vídeo intitulado (sem nenhuma cerimônia) "O fundador da Igreja Católica"... Não preciso nem dizer que era um filminho dos mais irresponsáveis, travestido de "documentário", afirmando aquela velha balela de que a Igreja Católica teria sido fundada por Constantino no 4º século. Deixei então um breve comentário tentando esclarecer ao autor do vídeo (que assina como 'Raphael Kriptos'), que, comprovadamente, no tempo de Constantino (imperador de 306 a 337), o Papa era Melcíades, 32º Sumo Pontífice da Igreja de Cristo depois de Pedro, e que, portanto não se pode afirmar que Constantino seja o fundador da Igreja, já que este apenas concedeu liberdade de culto aos cristãos, que obviamente já existiam desde o século I. Este blog publicou postagens sobre este assunto, que podem ser lidas aqui, aqui, aqui e aqui.

Em meu comentário expliquei, ainda, que a Igreja de Cristo já era chamada "católica" (isto é, Igreja Universal, como consta na Carta aos Hebreus 12,22-24, que fala da Igreja dos santos, chamando-a de kαθολικός eκκλησία, ou katholikón ekklésia, e quer dizer, exatamente, Igreja Católica). Tudo que fiz, como se pode notar, foi compartilhar informações, apontando fatos históricos conhecidos e bem documentados, não se tratando de opinião pessoal minha ou de quem quer que seja. Mas a resposta de Raphael chegou ao meu e-mail, nos seguintes termos:

"E óbvio q os cristãos (já) existiam (antes de Constantino), mas não a igreja católica e nem mesmo pedro como papa, pois em nenhuma parte a bíblia cita pedro como um suposto líder de toda igreja, se (isto) existe nos mostre!"

Ignorando o fato de eu ter demonstrado que a Igreja de Cristo já era a Igreja Católica, que já era conduzida pelo Papa, desde o tempo dos Apóstolos, Raphael alega que os cristãos já existiam, mas não a Igreja e nem a autoridade do Papa... E só para não variar, ele exige que tudo que eu diga esteja escrito, literalmente, na Bíblia. Evidente que nós, católicos, não dependemos exclusivamente da Bíblia para crer ou deixar de crer em alguma coisa, até porque a Bíblia é filha da Igreja, e não a sua mãe: nós só cremos na Bíblia como "Palavra de Deus" porque a Igreja, em torno do século IV, assim definiu.

Em outras palavras, depender exclusivamente da Bíblia para aceitar algo como verdadeiro ou falso é a mais frágil de todas as maneiras de viver a fé, por uma razão muito simples: quem definiu o que é a Bíblia foi a Igreja Católica. Fora dos livros que a Igreja definiu como canônicos, isto é, livros inspirados por Deus, e portanto sagrados, dignos de compor a Bíblia Cristã, existem mais outras tantas dezenas de "evangelhos" e "cartas de apóstolos", que só não fazem parte da Bíblia porque a Igreja os descartou como "apócrifos" e não inspirados. Então, todo seguidor da doutrina da sola scriptura (que crê que somente a Escritura serve como regra de fé e prática para o cristão), está, muitas vezes sem saber, observando algo que a Igreja Católica definiu. Dito isto, registro abaixo a minha resposta ao Raphael no Youtube, com meus argumentos fundamentados nas citações bíblicas, como ele pediu:

Raphael disse: "...em nenhuma parte da bíblia cita pedro como um suposto líder de toda igreja, se (isto) existe nos mostre!"

Vamos lá: podemos ler juntos o que diz o Evangelho segundo João, no capítulo 21, dos versículos 14 ao 17:

"Já era a terceira vez que Jesus se manifestava aos seus discípulos, depois de ter ressuscitado dentre os mortos. E, depois de terem jantado, disse Jesus a Simão Pedro: 'Simão, filho de Jonas, amas-me mais do que estes?' E ele respondeu: 'Sim, Senhor, tu sabes que te amo'. Disse-lhe Jesus: 'Apascenta os meus cordeiros'.

Tornou a dizer-lhe Jesus, pela segunda vez: 'Simão, filho de Jonas, amas-me?' Disse-lhe Simão Pedro: 'Sim, Senhor, tu sabes que te amo'. Disse-lhe o Senhor: 'Apascenta as minhas ovelhas'. Disse-lhe Jesus terceira vez: 'Simão, filho de Jonas, amas-me?' E Simão entristeceu-se por lhe ter dito a terceira vez: 'Amas-me?, e disse-lhe: 'Senhor, tu sabes tudo! Sabes que eu te amo'. E Jesus disse-lhe: 'Apascenta as minhas ovelhas'". (João 21,14-17)

Assim como se referiu à Igreja como o seu rebanho, e chamou a si mesmo "Bom Pastor", Jesus pede a Pedro que apascente seus cordeiros e suas ovelhas, isto é, que cuide e conduza a sua Igreja, e a nenhum outro. Está mais do que claro que Jesus está designando Pedro para conduzir a sua Igreja neste mundo, a partir daquele momento.

Mas não é só isso. Vamos ler o capítulo 15 do livro dos Atos dos Apóstolos, que narra o que aconteceu na ocasião em que certos fariseus, recentemente convertidos ao cristianismo, diziam que era preciso circuncidar os pagãos e obrigá-los a observar os rituais e costumes judaicos, para que pudessem seguir a Jesus Cristo. Começou um grande debate na Igreja primitiva, até que, por fim, entraram em acordo: Paulo, Barnabé e outros iriam reunir-se aos Apóstolos e anciãos em Jerusalém, para encontrar um consenso. Depois de muita discussão, Pedro se levantou e falou a todos: “IRMÃOS, SABEIS QUE JÁ HÁ MUITO TEMPO DEUS ME ESCOLHEU DENTRE VÓS, PARA QUE DA MINHA BOCA OS PAGÃOS OUVISSEM A PALAVRA DO EVANGELHO". E a Bíblia conta que toda a assembléia se calou e ouviu (At 15, 1-12). Foi assim que a circuncisão e outros costumes judaicos foram abolidos no cristianismo: por meio de uma decisão de Pedro, o primeiro líder da Igreja, seu primeiro pastor terreno, o primeiro Papa, mesmo que naquela época ainda não usasse esse título. Pedro mesmo declara que foi escolhido ou eleito dentre todos os Apóstolos! Está na Bíblia.

Não seria preciso continuar, mas ainda não acabou: tem muito mais! No Evangelho segundo Lucas, o próprio Senhor Jesus Cristo diz a Pedro: "Simão, Simão... Satanás reclamou o poder de vos peneirar como ao trigo. Mas Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça. E tu, confirma aos teus irmãos" (Lc 22, 31-32).

O próprio Senhor Jesus Cristo diz que assiste a Pedro, que roga por ele, e mais uma vez lhe transmite a tarefa de confirmar seus irmãos, isto é, os Apóstolos e os cristãos fiéis. Será preciso mais do que isso? Não, mas eu deixei o melhor para o final...

A passagem mais categórica e decisiva está no Evangelho segundo Mateus, capítulo 16, versículos 15 ao 19, que é o trecho da Bíblia que todo adversário da Igreja mais detesta e faz questão de ignorar. Pois é exatamente onde Jesus muda o nome de Simão Barjonas (filho de Jonas) para Pedra ('Pedro' no português, pois pedra é substantivo feminino e não poderia ser aplicado a um homem), declara que sobre aquela Pedra fundaria sua Igreja, que as portas do Inferno não prevaleceriam contra ela, e ainda, - na mesma fala, - entrega a este mesmo Pedro as Chaves do Reino dos Céus, decretando que tudo o que ele ligasse na Terra seria ligado no Céu, e o que ele desligasse na Terra seria desligado no Céu. Esta é, na minha opinião, a passagem mais clara, definitiva e conclusiva a respeito da autoridade de Pedro sobre a Igreja.

Concluindo: Jesus pede exclusivamente a Pedro que apascente suas ovelhas e cordeiros, isto é, que conduza a sua Igreja. Jesus entrega as Chaves do Reino dos Céus a Pedro, dizendo que tudo o que ele ligar ou desligar na Terra será ligado ou desligado no Céu. Jesus muda o nome dele, de Simão para Pedra, e diz que sobre aquela Pedra edificaria sua Igreja neste mundo. Tudo isso está na Bíblia. O que mais é preciso para que alguém que tem a Escritura como regra máxima de autoridade entenda, de uma vez por todas, que a Bíblia diz sim, e enfaticamente, que Pedro foi o primeiro líder da Igreja? O que mais é preciso para que estas pessoas, que sinceramente tentam observar as Sagradas Escrituras, parem de pensar e proclamar o contrário do que elas mesmas dizem?
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